Resignação ao Esquema – Quando nos Perdemos para Sobreviver
Na prática clínica, é frequente ouvir frases como:
"Não sei porque fico nisto, mas parece que não consigo fazer diferente."
"É mais forte do que eu. Já tentei mudar, mas acabo sempre por voltar ao mesmo."
Estas frases refletem um fenómeno que, na Terapia do Esquema, chamamos de resignação ao esquema (schema surrender). É um dos três principais estilos de coping — ou estilos de sobrevivência emocional — que desenvolvemos para lidar com esquemas mal-adaptativos.
Hoje escrevo sobre este estilo em particular, talvez o mais difícil de compreender e, muitas vezes, o mais doloroso de viver.
O que é a "resignação ao esquema"?
É quando a pessoa se submete passivamente ao seu esquema, acreditando que aquilo que sente ou pensa sobre si mesma ou sobre os outros é, de facto, verdade.
Ao contrário de outros estilos (como o evitamento ou a sobrecompensação), a pessoa que se resigna sente a dor emocional dos seus esquemas de forma intensa — mas em vez de lutar contra ela de forma saudável, entrega-se, aceitando-a como inevitável.
Importa reforçar:
Não se trata de fraqueza, escolha consciente ou "vontade de sofrer".
Do ponto de vista da Terapia do Esquema, a resignação não tem origem em "masoquismo" ou prazer na dor. Pelo contrário:
É uma resposta profundamente enraizada, onde a pessoa, muitas vezes desde a infância, aprendeu que não vale a pena lutar.
É uma forma de sobreviver num mundo onde as suas necessidades emocionais não foram reconhecidas ou satisfeitas.
Por que razão alguém se resignaria àquilo que a faz sofrer?
É uma questão legítima. Porque é que alguém permaneceria em relações em que é maltratado(a)? Porque toleraria comportamentos que o(a) fazem sentir constantemente inferior ou rejeitado(a)?
A resposta está no poder dos esquemas.
Um esquema é um padrão emocional e cognitivo duradouro, construído sobretudo na infância, que molda a forma como percebemos a nós próprios, os outros e o mundo.
Se um esquema nos diz que "não somos bons o suficiente", começamos a viver em conformidade com essa crença, mesmo que nos magoe.
A resignação, neste contexto, é uma aceitação inconsciente de que "as coisas são assim" e de que não há alternativa.
Como se manifesta a resignação?
As pessoas com este estilo de coping tendem a:
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Assumir papéis passivos ou subalternos nas suas relações;
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Sentir-se frequentemente como uma "criança insegura" perante figuras de autoridade ou parceiros;
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Ter dificuldade em reconhecer ou expressar as suas próprias necessidades;
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Depender excessivamente dos outros para orientação, validação ou decisões do dia a dia.
Um exemplo realista:
A "Paulina" (nome fictício) sentia-se profundamente envergonhada em contextos sociais. Tinha a sensação de que todos a achavam ridícula ou inferior. Após cada interação, revia mentalmente cada detalhe, envergonhada com o que tinha dito ou feito. Ao invés de questionar esta visão de si própria, resignava-se a ela.
No seu relacionamento amoroso, deixava todas as decisões nas mãos do namorado. Ele, por sua vez, oscilava entre protegê-la e menosprezá-la. Quando era crítico ou impaciente, Paulina assumia que a culpa era dela, reforçando ainda mais os seus esquemas de Defeito e Incompetência.
Este é um exemplo claro de como a resignação mantém e intensifica os esquemas negativos, impedindo a pessoa de se libertar do sofrimento.
A resignação e a orientação para o outro
Este estilo de coping surge frequentemente associado aos esquemas do domínio da "Orientação para o Outro", como:
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Subjugação – suprimir as próprias vontades para evitar conflito ou rejeição;
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Auto-sacrifício – dar-se aos outros em excesso, negligenciando as próprias necessidades;
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Busca de Aprovação – depender fortemente da aceitação dos outros para se sentir valorizado(a).
Nestes casos, a pessoa parece "boazinha", sempre pronta a ajudar — mas muitas vezes fá-lo a custo de si própria. Por dentro, sente-se esgotada, invisível ou mesmo irrelevante.
Há saída?
Sim. E é precisamente isso que procuramos na Terapia do Esquema.
O primeiro passo é compreender que este padrão não é culpa da pessoa, mas sim uma adaptação emocional antiga que já não serve os seus interesses atuais.
O processo terapêutico foca-se em:
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Identificar os esquemas presentes e perceber como foram formados;
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Tomar consciência dos comportamentos de resignação que os mantêm ativos;
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Fortalecer o "eu saudável", capaz de se proteger, cuidar de si e afirmar as suas necessidades de forma segura e assertiva.
Este trabalho requer tempo, empatia e compromisso — mas é possível.
Muitas pessoas reencontram, ao longo da terapia, uma nova forma de estar: mais livre, mais confiante e mais fiel a quem realmente são.
Em resumo
A resignação ao esquema é um padrão emocional profundo, muitas vezes silencioso, mas que limita seriamente o bem-estar e a autonomia emocional de quem o vive.
A boa notícia é que este padrão pode ser compreendido, trabalhado e transformado.
Não é fácil, mas é possível — e, muitas vezes, libertador.
Se se reconhece neste estilo, ou se sente que vive constantemente para agradar os outros enquanto se anula, talvez seja o momento certo para procurar apoio terapêutico.
Na Terapia do Esquema, caminhamos consigo, passo a passo, rumo a uma vida mais alinhada com as suas verdadeiras necessidades emocionais.