2ª a 6ª feira, excepto feriados.

Forte por fora, frágil por dentro

22-08-2025

"Não posso mostrar fraqueza."
"Se eu for o melhor, ninguém me vai magoar."
"Tenho de manter tudo sob controlo — sempre."

Estas são frases que ouço com frequência em consulta. São expressões de um estilo de coping que, à superfície, parece sinal de força, mas que esconde, muitas vezes, feridas emocionais profundas: o estilo de coping de sobrecompensação.

Neste artigo, convido-o(a) a conhecer melhor este estilo de funcionamento emocional, a perceber o que o origina, como se manifesta e de que forma pode estar a moldar — e a limitar — a sua vida.

O que é a sobrecompensação?

Na Terapia do Esquema, a sobrecompensação é um dos três grandes estilos de coping (juntamente com a resignação e o evitamento). Representa uma tentativa de "fazer o oposto" do que sentimos no fundo.

Se uma parte de si se sente vulnerável, inferior ou indesejada, a sobrecompensação procura mascarar essas emoções com posturas de força, controlo, sucesso ou superioridade.

É importante sublinhar: isto não é consciente. As pessoas com este estilo não estão "a fingir" nem a manipular. Estão, na verdade, a tentar proteger-se — com os recursos que têm — de dores emocionais profundas que, muitas vezes, se originaram na infância.

Exemplos de sobrecompensação

Este estilo pode assumir diferentes formas:

1. Buscar estatuto ou sucesso a todo o custo

Imagine uma criança que cresceu a sentir-se invisível ou insuficiente. Em adulta, pode tornar-se alguém altamente competitiva, obcecada com sucesso, beleza ou reconhecimento.

A necessidade de validação externa mascara um esquema interno de Defectividade ou Vergonha.

2. Excesso de controlo

Pessoas que cresceram em ambientes caóticos, com perdas precoces ou situações traumáticas, podem desenvolver um estilo hipercontrolador.

"Se eu controlar tudo, nada de mau acontecerá."
É o caso do Eduardo, um cirurgião de excelência, descrito como um "maníaco da ordem". Esta postura era uma tentativa de evitar sentir o medo e a impotência que experimentou quando perdeu os pais em criança.

3. Arrogância ou superioridade

Por vezes, a sobrecompensação manifesta-se em atitudes críticas, frias ou arrogantes face aos outros — uma tentativa de nunca mais se sentir "por baixo".

Mas por trás da fachada, há quase sempre sentimentos antigos de inferioridade, rejeição ou abandono.

4. Agressividade como escudo

Algumas pessoas que foram vítimas de abuso físico ou emocional tornam-se agressivas ou intimidadoras.

A agressão torna-se um mecanismo de defesa contra a vulnerabilidade.
Rui, por exemplo, agrediu o pai após anos de violência doméstica e acabou por entrar num ciclo de violência. Só em terapia começou a contactar, pela primeira vez, com o medo e a dor que estavam na base do seu comportamento.

O caso do Henrique: sucesso e vazio

Henrique era um agente imobiliário de sucesso, sempre rodeado de glamour. Charmoso, confiante, perfeccionista. Mas as suas relações íntimas eram distantes e controladoras. Exigia atenção, mas recusava-se a mostrar vulnerabilidade.

Por trás da imagem segura, escondia-se um medo profundo de falhar ou de ser rejeitado.

Henrique acreditava que o seu valor vinha do que conseguia conquistar — estatuto, beleza, performance — mas por dentro sentia-se muitas vezes só e inseguro.
Este é um exemplo clássico de sobrecompensação: a imagem externa de sucesso e controlo a tentar abafar o esquema interno de Defetividade, Privação Emocional ou Abandono.

Mas se "funciona", qual é o problema?

A sobrecompensação pode trazer benefícios aparentes: sucesso profissional, reconhecimento, estatuto, controlo...
Mas tudo isto tem um preço:

  • Relações superficiais ou disfuncionais;

  • Dificuldade em pedir ajuda ou mostrar fragilidade;

  • Ansiedade crónica, insatisfação ou burnout;

  • Incapacidade de relaxar ou de sentir verdadeira conexão emocional.

Pior ainda: o esquema interno nunca é curado — apenas silenciado temporariamente.

E quando algo corre mal — uma falha, uma perda, uma crítica — o esquema é ativado de forma intensa.
A sensação de desvalorização, medo ou vergonha volta, com força redobrada.

Porque é tão difícil largar este padrão?

Porque ele funcionou — durante muito tempo — como um escudo emocional.
Muitas destas pessoas aprenderam, desde cedo, que mostrar vulnerabilidade era perigoso. E, por isso, construíram uma armadura.

Mas essa armadura, que em tempos protegeu, hoje pode estar a impedi-lo(a) de viver com autenticidade, afeto e liberdade.

Como a Terapia do Esquema pode ajudar?

Na Terapia do Esquema, trabalhamos para:

  • Identificar os esquemas centrais por trás do comportamento de sobrecompensação;

  • Ajudar a reconhecer os custos emocionais desta armadura;

  • Trabalhar emoções como medo, tristeza ou vergonha de forma segura e estruturada;

  • Fortalecer um "Eu Saudável" que possa expressar vulnerabilidade sem medo, e estabelecer relações mais genuínas e equilibradas.

Em resumo

A sobrecompensação não é arrogância, nem manipulação — é uma tentativa de proteger um coração ferido.
Mas viver sempre em modo de defesa pode tornar-se solitário, exaustivo e limitador.

Se se reconhece neste padrão, saiba que há outra forma de estar no mundo — uma forma mais leve, mais próxima, mais verdadeira.

A Terapia do Esquema pode ajudá-lo(a) a baixar a guarda, sem perder a dignidade. A descobrir que é possível ser forte e vulnerável ao mesmo tempo.

Crie o seu site grátis!